SEJAM MUITO BEM VINDOS E BEM VINDAS!

Será bom para a Política

Falta apenas a votação de alguns destaques para que a Câmara dos Deputados acabe de aprovar mais um projeto de lei de iniciativa popular, que recebeu o significativo nome de “Projeto Ficha Limpa”. Depois o projeto irá para o Senado. A proposta esteve em discussão no Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral por vários anos e foi apresentada na assembléia geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em abril de 2008, recebendo a acolhida unânime do episcopado católico nacional e a promessa de seu empenho para promover a coleta das assinaturas necessárias, como prescreve a Constituição.

O projeto de lei, que prevê o veto da candidatura a cargos políticos para pessoas condenadas por crimes graves, vem complementar a lei 9840, contra corrupção eleitoral, que já rendeu muitos frutos para o País. Com a CNBB, a OAB, associações de magistrados e procuradores da justiça, muitas outras organizações da sociedade somaram esforços e recolheram mais de um milhão e seiscentas mil assinaturas em todo o Brasil. Na campanha virtual, acrescentaram-se a essas ainda outras duas milhões de assinaturas. O enorme volume de folhas assinadas, junto com o texto da proposta de lei, foi introduzido e recebido pela Câmara em setembro de 2009, justamente quando a lei 9840, conhecida em Brasília como “a lei dos bispos”, completava 10 anos.

O acolhimento e a assinatura da proposição na Câmara por um grupo representativo de parlamentares de todos os partidos políticos, evidenciou que não se tratava do projeto de um grupo ou partido, mas representava o anseio de toda a sociedade brasileira. Outros textos parados na Câmara, com teor e interesse semelhantes, foram agrupados dentro desse único projeto de lei.

Em seguida, foi novamente decisiva a participação da sociedade civil, que manifestou suas opiniões a respeito do projeto de lei durante uma audiência pública. O texto foi aperfeiçoado na Câmara, acolhendo um dos argumentos mais utilizados pelas vozes contrárias e que punha em risco a aprovação do projeto de lei. Ao invés de bastar a condenação em primeira instância, por um único juiz, para impedir a candidatura a cargos políticos, o texto da lei, reformulado, impede apenas a candidatura daqueles que já receberam a condenação num colegiado judicante. Com isso, evita-se que o novo dispositivo jurídico seja manipulado para atingir objetivos menos transparentes.

A lei da “Ficha Limpa”, uma vez aprovada, representará o fruto de muitos debates e traduzirá a vontade do povo, acolhida e repercutida nas manifestações de diferentes organizações da sociedade civil e, finalmente, também pelos parlamentares. Até no momento da votação, na Câmara, bem que se tentou alterar e até esvaziar o projeto de lei, para torná-lo inócuo. Descaracterizá-lo, porém, teria sido um desrespeitoso e até uma desconsideração por aquilo que grande parte da população brasileira entende como justo e seguro na escolha daqueles que deverão legislar ou ocupar cargos executivos. De fato, o mandato político é delegado pelo povo nas eleições e seu ocupante é depositário da confiança dos seus eleitores. Ainda bem que os principais destaques já foram derrubados; esperamos que os demais, ainda pendentes, também o sejam.

A esperança é que a lei da “Ficha Limpa” traga frutos muito bons para a vida política brasileira. O País precisa de profundas reformas políticas: Ora, é bom começar apostando em políticos com idoneidade moral elevada. Não deixa de suscitar preocupações a resistência de setores do Congresso contra a aprovação do Projeto de Lei. Parece tão óbvio que aqueles, que vão fazer leis, governar, administrar o dinheiro e o patrimônio público devam ostentar honestidade pública e credibilidade moral. Alguém tem alguma coisa contra? Certamente ninguém quer entregar o futuro do País, do seu Estado ou município para um candidato em quem não se pode confiar.

De fato, o objetivo nobre dos cargos políticos é a promoção do bem comum. Uma vez superados na Câmara os últimos destaques, a nova lei certamente criará problemas para as pretensões daqueles, que quiserem pleitear mandatos políticos com objetivos alheios ao bem do povo e do País. Mas além de impedir o acesso a cargos políticos de pessoas com idoneidade moral comprometida, a lei da Ficha Limpa poderá atrair para o exercício da missão política cidadãos sérios e competentes que, por vezes, se afastam da política por entenderem que ela, infelizmente, está maculada de maneira irremediável.

A campanha para a coleta das assinaturas e o próprio processo de aprovação do projeto de lei já enriqueceram a compreensão da sociedade sobre seu papel de protagonista do processo político. O povo é o principal sujeito político do País e precisa usar bem desse potencial, sobretudo através dos mecanismos previstos na Constituição. A lei da “Ficha Limpa” também tem o mérito de traduzir num dispositivo jurídico eficaz algo que parecia uma aspiração abstrata dos cidadãos, embora justa e bem fundamentada. Trata-se, portanto, de um grande ganho para o País! O povo já conseguiu conquistar mecanismos de supervisão e controle, no decurso do mandato, dos políticos eleitos. A nova lei vai além disso e possibilita, desde antes das eleições, evitar que os cargos não sejam ocupados por cidadãos que já tem ficha suja. Será muito bom para a Política.

Com a aprovação do “Ficha Limpa”, o Brasil dá mais um passo para a tão sonhada reforma política, que não se restringe a um evento pontual, mas é um processo de amadurecimento da sociedade e suas organizações, junto com as instituições do Estado.

Cardeal Odilo Pedro Scherer

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